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Ler em Dezembro
Livro 'Amor de Deus'
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Maria levou a chávena à boca e bebeu com satisfação. Não se recordava da última vez que tivera um pequeno-almoço tão sossegado e silencioso e sem sentir medo. Como aquele café com leite era delicioso. Fechou os olhos com o prazer que teve ao saboreá-lo.
Francisco voltou a reparar nas nódoas negras que tinha no braço. Aquela cor roxa incomodava-o.
“-Caiu?”
“-Desculpe?!” – Assustou-se.
“-No seu braço, tem um hematoma. Caiu?”
“-Anh…” – Tentou puxar a manga da camisola para baixo. “-Sim, sou um pouco desastrada.” – Baixou o olhar.
Francisco viu a mentira estampada no seu rosto, os olhos mostraram dor. Tanta dor como ele nunca tinha visto. A mágoa assombrara-lhe os traços gentis. Ficou rígida e tensa. O que é que se passava?
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Francisco olhava atentamente para Maria. A sua tez clara e o seu olhar triste e distante fascinavam-no. Mais do que aquilo que era para ele possível. Nunca se atrevera a olhar assim tanto para uma mulher. Nem podia! Era pecado! Mas ela era especial. Tão especial…
(...)
Alzira surgiu com um tabuleiro cheio – pão, leite, café, manteiga, doce, bolo de laranja, tostas. Colocou tudo na mesa e foi buscar chávenas e talheres.
Francisco serviu café e leite a Maria. O silêncio dela contrastava com a sua vontade de falar, a sua tristeza era contrária à sua alegria. Que esconderia aquele olhar? Porque teria medo de falar ou de o olhar? Porque será que parecia estar sempre a olhar para trás, com medo de alguma coisa?
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Maria sentia-se incomodada com a presença daquele homem, não por ele impor respeito mas porque era bastante atraente e simpático. Atraente demais!
“-Pronta para o seu primeiro dia de trabalho?”
Maria baixou o olhar e limitou-se a responder um simples: “-Sim.”
“-Nelita, acompanha-nos num café?”
“-Obrigada, senhor Francisco. Acabei de beber um com o senhor Amorim. Hoje trouxe-me flores!!” – Torceu os olhos.
“-Oh Nelita devia reconsiderar o pedido de casamento!!” – E deu uma gargalhada.
Nelita bateu com a mão no jornal: “-Não brinque!! Diz que me vai trazer o anel de noivado que era da mãe!” – Fez uma breve pausa. “-Um dia ainda apareço como notícia neste jornal ‘Funcionária de lar tenta bater em velhinho que a assediava’!!” – Ficou muito séria.
“-Oh Nelita! Tenha dó de mim!” – Meteu a mão no braço de Maria. “-Vamos Maria, acompanhe-me no pequeno-almoço!”
Maria sentiu-se incomodada com o seu toque mas sem o dar a entender libertou o braço. Sentia-se perdida. Não merecia que a tratassem assim. Não merecia que fossem simpáticos com ela.
“-Não se assuste com a Nelita, é uma excelente senhora! Ah, eu peço desculpa mas não comi nada antes de sair de casa e como adoro conversar, não gosto de comer sozinho, por isso…” – Olhou-a com uns grandes olhos castanhos, cheios de vida e muito iluminados e com um sorriso quase contagiante.
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Ouvia o barulho das águas e lembrava-se dos passeios que fizera com o avô junto ao rio. O avô pescava enquanto ela corria e brincava. Apanhava sempre flores para a jarra da cozinha. Virou-se para onde vinha o barulho, tinha que ir lá.
A paisagem tinha mudado bastante. Havia mais casas, mais movimento, mais cor. Mas mesmo assim tudo lhe parecia familiar. Sempre que sentia um barulho a seu lado, tinha medo. Tremia. Lembrava-se sempre de Luís a aparecer e a bater-lhe sem razão aparente. Olhou por cima do ombro. Talvez tivesse sido apenas o vento. Talvez…
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Não sabia em que estado estava a casa mas esperava que estivesse no mínimo razoável para poder habitar lá. Era só isso que pedia!
Sentia-se cansada mas quando avistou a casa essa sensação desvaneceu. Parou no caminho e olhou para a mesma, por instantes recuou no tempo. Para um tempo onde foi feliz e onde se sentia segura nos braços do avô. Fechou os olhos e sentiu o cheiro do cozido à portuguesa que o avô fazia no velho fogão de lenha. Jurava que sentia o abraço apertado que o avô lhe dava. Jurava que sentia as picadelas no rosto quando a beijava. Limpou as lágrimas que lhe escorriam pelo rosto, controlava-se para não chorar convulsivamente. Não aguentava a tristeza que lhe invadia o peito. Respirou fundo e continuou até chegar ao velho portão de ferro.
“-Agora sim, Maria, podes começar de novo.” – Disse para si mesma enquanto abria, a custo, o portão. Queria acreditar que ao entrar com o pé direito teria sorte. Muita sorte para tudo o que viria a seguir.
Olhou para o jardim. A cerca de madeira estava bastante destruída. Em algumas partes já nem existia. Lembrava-se de o avô lhe contar como a construiu e a ajuda que teve de um vizinho para tal. As ervas do jardim chegavam-lhe aos joelhos, as roseiras estavam mortas e o limoeiro quase seco. Como a avó gostava daquelas rosas. Orgulhava-se de as ver pela janela e sentir-lhes o cheiro a metros de distância. Apanhava-as e colocava-as numa jarra na janela da cozinha. O limoeiro era o seu orgulho. Sempre de folhas bem verdes e cheio de pequenos pontinhos amarelos.
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Maria entrou na pequena loja do largo e sentiu-se bastante observada. Andava a medo, não queria que a sua presença fosse notada. Ao balcão estava uma senhora que aparentava pouco mais de cinquenta anos e com ela uma outra bem mais velha, vestida de um preto muito carregado. Deixou a sua mala na entrada e olhou para o relógio. A loja fechava às vinte horas, o que ainda lhe dava algum tempo para percorrer as prateleiras e procurar o que necessitava. Podia escolher à vontade e comparar preços. Achava que conhecia aquele espaço. Será que tinha ido lá com o avô? Não tinha a certeza. Havia memórias que pareciam ter sido apagadas da sua mente. E isso magoava-a.
“-Conheces a rapariga, Rosinha?” – Sussurrou enquanto via Maria afastar-se entre as prateleiras.
“-Nunca a vi antes…”
“-Hoje estava no largo a falar com o Manel da Fonte, mas ele recusou-se a dizer-me quem era ou o que queria…” – Cruzou os braços. “-Será familiar de alguém de cá?”
Maria passeou-se por entre as prateleiras. Apesar de ser um minimercado pequeno tinha de tudo um pouco. Procurava o essencial para uns dias. Contou o dinheiro que tinha, pouco mais de cinquenta euros. Tinha conseguido juntar o dinheiro através das gorjetas e sem Luís saber.