E tudo o mar levou! - Diário de João Maravalhas 30 julho de 1933
Livro 'E tudo o amr levou'
30 de julho de 1933
O meu pai teve um acidente de barco na última madrugada. No barco ia
ele, o meu irmão e mais alguns camaradas! Foi uma noite de tormento para
todos nós. A sorte de todos eles é que mesmo ali ao lado passava outra embarca‑
ção e ajudou‑os. A minha mãe chorou no areal quando soube desta notícia. Foi
arrepiante ver todas aquelas mulheres ali a chorar e nós impotentes sem nada
poder fazer! A ajuda marítima veio logo de seguida, as ondas levantavam,
pareciam paredes levantadas por um Deus superior qualquer. Medo! Terror!
Como é que é possível estes homens irem ao mar, lutar pela vida, lutar por comida
na mesa e não terem medo? Por Deus, nunca estarei no cimo daquelas ondas!
O pai passou‑me o diário, quer que eu continue com a sua escrita, diz que
viu a morte a passear nas ondas do mar! A morte ria‑se de todos eles e reclamava
as suas almas! O meu pai ficou com medo. Agora eu tenho a responsabilidade
de continuar a escrever sobre o mar. Sobre o que os homens passam.
Começou a ser escrito pela minha avó. Noto que faltam aqui algumas folhas,
não sei a razão e nunca irei perguntar. Talvez fossem coisas íntimas demais,
afinal é um diário.
João Maravalhas