' O velho armário de madeira e vidro ainda suportava o peso dos pratos
de porcelana. A renda amarelecida pelo tempo estava em todo o lado. Na
mesa, nos armários, por cima da televisão, nas costas do sofá. Lembrava‑se
da avó a fazer magia com as linhas e a pequena agulha. A pequena
credência, ali a seu lado, tinha tantas molduras que parecia impossível
caberem todas ali. Todas as fotos eram de homens. Todos eles levados pelo
mar. Todas elas manchadas pelo sal das lágrimas. Havia ali uma pequena
bíblia, a mesma que a avó levava aos domingos de manhã à missa. Pegou
no pequeno santo de pedra que também ali estava. Passou os dedos pelas
imensas rachadelas que ele tinha. Todas derivadas às imensas quedas que
lhe tinha provocado pelas brincadeiras.'